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segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Como Se Deu o Processo de Independência no Brasil Durante o Primeiro Reinado






A independência do Brasil não foi como muitos pensam, uma consequência natural dos fatos vinculados à crise do sistema colonial versus metrópole. Por longo tempo, até a primeira metade do século XIX, a questão da independência esteve limitada à ações regionais. As inconfidências não assumiram papel de destaque na historiografia brasileira em razão do Brasil ainda não ter desenvolvido até então, laços de pertencimento capazes de criar um sentimento nacionalista. A chegada da Corte de D. João VI em 1808, trouxe uma série de transformações à América Portuguesa, através das várias ações estratégicas tomadas por D. João para fugir do Bloqueio Continental imposto pela França e que fizeram com que o Brasil adquirisse o status de Reino Unido de Portugal, e não mais de colônia.

Após o grito do Ipiranga, tanto a imprensa quanto as autoridades, tocavam no assunto de maneira cuidadosa em suas cartas pessoais e correspondências de trabalho. Algumas vezes, ainda insistiam na importância do Reino Unido. Outras vezes, criticavam e relembravam os desmandos e abusos cometidos pelas cortes lisboetas, reafirmando o rompimento como a decisão mais acertada. Um dos argumentos usados para legitimar e manter a separação política foi o de que após a independência, cessaram as rebeliões de rua em cidades como o Rio de Janeiro, onde os negros 'capoeiras' promoviam desordens nas vias públicas. Essas insurreições da população 'de cor' da Corte com suas fugas, ajuntamentos e tumultos, não era apenas uma ameaça, mas uma realidade cotidiana, onde escravos e libertos, participaram com igual intensidade dos movimentos políticos do país
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A liberdade era o centro das discussões nos espaços públicos no início do século XIX, sobretudo com as medidas tomadas por D. João VI à partir do estabelecimento da Corte no Brasil. A Corte portuguesa, no entanto, negava-se a reconhecer o direito à autonomia do Brasil, sustentando o discurso de que ambos os países faziam parte do mesmo reino com sede em Lisboa, porém tratando as regiões da então colônia, como as províncias existentes em Portugal pelo temor de que após o sucesso da Revolução do Porto em 1820, pudessem se ver novamente dependentes das decisões tomadas no Rio de Janeiro.

As aspirações à autonomia no Brasil passaram a ser vistas como ilegítimas e conspiratórias. Em 11 de fevereiro de 1822, a delegação da cidade de São Paulo tomou assento no parlamento com um projeto para restabelecer os negócios políticos entre Brasil e Portugal. Segundo esse projeto, as duas monarquias permaneceriam unidas, porém com administração, instituições e leis independentes, bem como a possibilidade de cada país poder estabelecer tratados comerciais individuais, além de introduzir relações comerciais mutuamente vantajosas. Os parlamentares paulistas propunham a existência de dois reinos numa espécie de federação, rejeitando desse modo, a tese de ser o Brasil uma província. A polêmica foi grande. Os integracionistas lutaram para desautorizar a comissão formada para estudar os assuntos do Brasil e acabaram por pedir punições à junta de São Paulo, em março de 1822. Capitaneados por Fernandes Tomás, os portugueses assumiram uma postura nacionalista com o objetivo de preservar a hegemonia lusitana e defendiam que caso os brasileiros não se submetessem à Corte portuguesa, deveriam se separar.




Por um lado, as propostas dos parlamentares paulistas ofereciam atrativos para os negociantes da metrópole que visavam a possibilidade de retomada dos monopólios, aliado ao fato de ainda considerarem o Brasil uma província, o qual poderiam enviar suas tropas para defender suas consignações no Nordeste, sobretudo em Pernambuco. Por outro lado, os integracionistas falavam em separação em nome da dignidade nacional e acenavam com a possibilidade de provocar desastradamente uma ruptura e isso a burguesia mercantil metropolitana não poderia admitir, uma vez que visavam não somente recuperar o monopólio, mas também buscar novos mercados e novas fontes de acumulação de capital, através do envolvimento com o mercado brasileiro e o tráfico de escravos.


O clima tenso entre os que defendiam suas posições fez com que deputados e jornalistas brasileiros começassem a clamar por uma assembléia própria e uma constituição específica para a América, a exemplo do que a Espanha havia feito com as suas colônias. Para os brasileiros, aceitar a submissão significaria a recolonização, ao passo que contrariar a Corte portuguesa, significava a independência. Ainda que a última alternativa fosse considerada como sinônimo de liberdade e autonomia, os brasileiros ainda não queriam um país totalmente liberto dos laços com Portugal pelo fato da independência não ter sido pensada e amadurecida como um rompimento. As ações foram sendo tomadas pelos "homens bons" desejosos de garantir e proteger a causa da liberdade que pouco tempo depois, foi transformada em causa da nação e mais tarde, em causa do Brasil. Na ótica de quem via o mundo pelas lentes americanas e não portuguesas, só a permanência do príncipe regente seria capaz de congregar os interesses de alguns como sendo de todos, depois de constatada a impossibilidade da união do projeto do império luso-brasileiro.


O constante medo da anarquia e das rebeliões de rua pela parcela negra da população, fizeram com que os políticos brasileiros invocassem em sua defesa os discursos sobre a barbárie dos africanos e dos negros em geral, através dos episódios sangrentos que sacudiram São Domingos em finais do século XVIII e início do século XIX. Os membros da Corte portuguesa, por sua vez, também se utilizaram desse discurso em suas tribunas para fazer ecoar suas ameaças de deixar o Brasil entregue à própria sorte e deixar a população branca, livre e bem nascida, à mercê da 'sanha' dos negros bárbaros. Tais vociferações, entretanto, faziam parte de um jogo teatral do lado português.


A população pobre e desvalida esteve maciçamente presente durante esse processo, conduzindo de maneira conjunta e efetiva os fatos. Gritando palavras de ordem em defesa uns dos outros, incitavam atitudes diferenciadas de acordo com as circunstâncias daquilo que estava em jogo. Juntamente com o povo, havia a participação de tropas composta por batalhões de libertos que viam na corporação uma oportunidade de conquistar autonomia, bem como a participação de escravos fugidos que dessa forma, tinham a chance de conquistar a alforria. A conquista da autonomia era também a esperança de estrangeiros e portugueses pobres que viviam na Corte e que de igual modo, se engajaram ao movimento formando fileiras menos qualificadas. Para a maioria das pessoas que compunham o povo, liberdade traduzia-se em pequenos atos do cotidiano que aos poucos foram tomando forma, ao longo do século XIX e foram se constituindo em direitos maiores vinculados à cidadania que no Brasil só passou a ser chamado de "direitos civis" em 1917, muitos anos depois da abolição.


A independência, à princípio assumiu um caráter de revolução com finalidades e perspectivas contraditórias. Para os negros e mestiços foi uma luta contra os brancos e seus privilégios. Já para os brancos despossuídos, significou uma subversão da ordem, uma promessa de emancipação, através da eliminação das barreiras de cor e a possibilidade de realizar a liberdade numa sociedade ainda contraditória, onde os elementos da classe senhorial continuavam interessados a ser senhores de terra e de escravos. Dessa forma, a independência não foi revolução nem ruptura, mas um processo de continuidade civilizatória iniciado pela metrópole. A emancipação, fruto de uma discordância agravada com o tempo pelos habitantes do Brasil para com as medidas recolonizadoras das Cortes, forçou D. Pedro I a agir para preservar a integridade do Império e a permanência dos privilégios conquistados pela aristocracia rural. Após a declaração da independência, optou-se pela continuação do sistema monárquico para assegurar esses privilégios.






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terça-feira, 1 de setembro de 2015

Pequeno Dossiê da Inquisição na Europa Durante a Idade Média






A Inquisição na Espanha

No ano de 1478, o Papa Sixto V assinou uma bula, através da qual foi fundada uma nova inquisição na Espanha. Esta bula se referia às petições dos reis católicos, enfatizando normas quanto à difusão das crenças entre os judeus convertidos ao cristianismo em Castela e Aragão. Centenas de acusados foram detidos e obrigados a renunciar à fé judaica para assumir publicamente a fé católica, tornando-se um novo converso. Entre os cristãos novos encontravam-se os mais ricos e nobres da cidade. Muitos fugiram para outros países, como Portugal e Norte da África, evitando assim, os tribunais da inquisição que os julgaria de infidelidade e heresia.

Em 13 de Março de 1490, a situação se agravou ainda mais contra os judeus. Alguns deles realmente se converteram ao catolicismo. Porém, outros que se diziam conversos, continuavam com suas práticas religiosas em oculto. Muitos se recusavam a aceitar a conversão forçada e fugiam. A pressão da Igreja para que se convertessem crescia cada vez mais e se um judeu aceitasse se batizar no catolicismo, poderia garantir um futuro seguro juntamente com mouros, visigodos e celtas que também habitavam a Península Ibérica. Estes judeus começaram então a sofrer um processo assimilativo, tornando-se cidadãos comuns. No entanto, os demais judeus que assumiram um catolicismo de fachada, tornaram-se vítimas de processos inquisitoriais e cunhados pejorativamente de "Marranos". Estes judeus tinham seus pertences confiscados e seus bens eram vendidos para pagar suas despesas na prisão. 

Estima-se que em 1480, mais de mil e quinhentos judeus foram queimados vivos na fogueira, amarrados em estacas como consequência de delações e falsos testemunhos. Os judeus que não confessavam arrependimento eram condenados à morte e os que conseguissem escapar desta condenação pela absolvição, saíam da prisão na mais absoluta miséria. 

Após o casamento da rainha de Castela com o rei de Aragão, vários decretos passaram a proibir o judeu converso de ocupar cargos públicos, bem como obter qualquer privilégio do estado espanhol. Finalmente, o decreto de expulsão de 31 de Março de 1492 promulgado pelos reis católicos, passou a obrigar o judeu que não se convertesse a deixar a Espanha em quatro meses.


A Inquisição em Portugal

Até fins do século XV, os judeus viveram em relativa paz social, tanto com celtas e visigodos, quanto com árabes e cristãos, chegando mesmo a alcançar significativas projeções no reino português. Porém, estas relações de boa convivência se deterioraram com a chegada de fugitivos da inquisição espanhola que haviam sido expulsos pelos reis católicos.

O Tribunal do Santo Ofício foi criado em Portugal unicamente por causa da questão judaica, onde os judeus mesmo forçados a adotar o catolicismo continuaram a preservar suas tradições religiosas, filosóficas, éticas e políticas. Oficialmente, o tribunal da inquisição começou no reinado de D. João III e era composto por padres, bispos, clérigos e alguns cristãos de absoluta pureza de sangue. Por se tratar de um cargo muito ambicionado, precisavam cada vez mais de "hereges" para mantê-lo. Para isso, qualquer prática, qualquer palavra ou gesto impróprio poderia ser considerado herético, pois quanto mais hereges fossem denunciados, mais a inquisição sobrevivia e se fortalecia. 

Quando a denúncia era feita ao tribunal o acusado era imediatamente preso e seus bens eram confiscados. Era chamado também a algumas audiências onde era coagido a confessar sua culpa, mesmo sendo inocente. Eram torturados e forçados a entregar pais, irmãos, vizinhos e suas mulheres eram atiradas à fogueira, acusadas de feitiçaria. 

Entre os portugueses condenados pela inquisição por heresia, encontrava-se Fernão de Pina, cronista-mor do reino e guarda-mor da Torre do Tombo, e também Damião de Góis, historiador e humanista, ambos denunciados e acusados por serem luteranos. Os portugueses, no entanto, foram mais perspicazes que os espanhóis, pois proibiam os judeus de deixar Portugal para não desmantelar a situação financeira e comercial do país, tendo em vista que os judeus em sua maioria eram prósperos. As condenações também foram mais brandas que na Espanha, pois geralmente condenavam os acusados do sexo masculino somente à prisão, poucas vezes condenando-os à morte como os espanhóis. 

O braço da inquisição portuguesa estendeu-se também ao Brasil. Os judeus que ali viviam, quando acusados eram julgados e após serem sentenciados eram enviados à Lisboa, onde eram encarcerados por meses ou anos e seus bens eram entregues à Igreja ou à Coroa. Esses judeus acabavam se transformando em mendigos, e muitos deles acabaram sendo levados à loucura.


A Inquisição na França

No século XI, apareceu no Sul da França, o "catarismo" ou "movimento dos albigenses". Os cátaros rejeitavam não somente a face visível da Igreja, mas também instituições como o matrimônio e o serviço militar. Por isso, constituíam grave ameaça não somente à fé cristã, mas também à vida pública. 

Apoiados por uma parte do povo e pelo conde de Toulouse, ganharam ainda mais confiança e provocaram diversos tumultos. Em contrapartida, tiveram suas casas destruídas e seus bens confiscados, resultando daí várias revoltas. Em 1242, começou uma guerra que só terminou com a intervenção do exército de Luís IX. 

Os hereges cátaros não somente foram punidos, mas também inquiridos pela inquisição. Os condes, barões e as demais autoridades civis já não os podiam ajudar sob pena de perder seus cargos ou ver o interdito lançado sobre suas terras por estarem sujeitos à acusação de catarismo. Assim, o conde Foix que até então, apoiava os cátaros, tornou-se um ardente apoiador da inquisição. Os hereges presos ou abjuravam ou eram entregues ao braço secular que lhes imporia a sanção devida. 

Os abusos impostos pela inquisição começaram a causar escândalo e as reclamações chegaram a Felipe, o Belo, que impôs limites às investigações e com sua intervenção restringiu o poder dos inquisidores que não podiam mais decidir nada sem o consentimento de um Bispo. Porém, algum tempo depois, Felipe, o Belo, teve de usar a inquisição contra os Templários, unicamente por caráter político. 


A Inquisição na Itália

Em 1542, a inquisição foi restabelecida como órgão oficial da Igreja, revigorada e dirigida por Roma através do Santo Ofício. Seu objetivo era deter com violência o avanço da Reforma Protestante na Europa. Sem poder unificar a Itália, a Igreja pretendia assumir sua alta soberania. O acordo político com Veneza foi primordial para o sucesso de seus planos, entre os quais, sagrar a papa alguns de seus membros, como os papas Pio V e Sixto VI.

Em 1566, Pio V adotou o princípio de que os acusados pela inquisição mesmo sendo absolvidos, poderiam se tornar suspeitos novamente. 

Entre os que foram perseguidos pela inquisição em Roma encontrava-se Galileu Galilei, físico italiano que fez numerosas descobertas nos campos da Física e da Astronomia. Suas descobertas e ensinos foram considerados heresia pelos censores romanos, em especial pela tese de que o sol era o centro do universo e que na verdade era a terra que girava ao seu redor. Doente e preso em Roma, combalido e ajoelhado diante dos representantes do papa Urbano VIII, ele leu e assinou sua retratação. 

Em 1998, o papa João Paulo II reconheceu os abusos cometido pelos 'filhos' da Igreja católica contra Galilei e pediu perdão em nome da Igreja. No entanto, não reconheceu os erros cometidos pela inquisição contra todos os demais que sofreram seus horrores.






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